Mãe Preta: releituras e ressignificações de uma canção brasileira – Amplificar

Mãe Preta: releituras e ressignificações de uma canção brasileira

Resumo

O presente artigo trata da canção Mãe Preta, composta nos anos 1930 pelos gaúchos Caco Velho e Piratini e regravada ao longo dos séculos XX e XXI por artistas de diversos países. A composição original, com texto de forte teor crítico sobre a escravidão, recebeu uma nova letra de autoria de David Mourão-Ferreira por ocasião de sua inclusão em uma cena do filme Les Amants du Tage, de Henri Verneuil (1955), em que era interpretada pela já bastante famosa cantora portuguesa Amália Rodrigues. Intitulada Barco Negro, tratava de uma mulher à espera do amado. Esta tornou-se a mais célebre, chegando a ser identificada como a original. Por meio da análise de diferentes versões, buscamos compreender os processos de apropriação e ressignificação a partir das diferentes escolhas textuais e musicais e da relação de cada uma com o contexto histórico, político e econômico em que se situa. Neste processo analítico, baseamo-nos no conceito de “tradução”, proposto por Julio Mendívil (2013). Entre as interpretações analisadas estão as dos brasileiros Conjunto Tocantins (1943), Ney Matogrosso (1975), Tamara Franklin (2016), Filhos da Tradição (2018), dos portugueses Maria da Conceição (1953), Roberto Leal (2002), Dulce Pontes (1996), Mariza (2006) e do grupo luso-africano Muxima (2006). Concentramo-nos especialmente na versão da cantora portuguesa Deolinda Bernardo, uma das mais recentes, a partir da qual propomos uma reflexão sobre a responsabilidade no uso de registros musicais e visuais no contexto da world music. Com relação a este aspecto, baseamo-nos no artigo A Sweet Lullaby for World Music (2000), de Steven Feld. Destaca-se ainda a substancial contribuição teórica do artigo Travessias do “Barco Negro” – o sequestro da mãe negra (2016), de Osmar Pereira Oliva, com o qual este trabalho pretende dialogar.

“Mãe-Preta”: re-readings and resignifications of a Brazilian song

This article broaches several versions of the song “Mãe Preta”, composed in the years 1930 by Caco Velho and Piratini, from Rio Grande do Sul, southern Brazil. The original work, with critical lyrics about Brazilian slavery, received a totally different poem by David Mourão-Ferreira when it was presented by the famous Portuguese singer Amália Rodrigues in Henri Verneuil’s movie Les amants du Tage (1955). The new lyrics told the story of a woman who waited for her lover by the sea. Based on their different musical and textual choices, we aim to analyze the processes of appropriation and re-signification, considering also the political and economic context. This analytical process is based on Julio Mendívl’s concept of “translation” (2013). Some of the versions discussed are those by Brazilian artists Conjunto Tocantins (1943), Ney Matogrosso (1975), Tamara Franklin (2016), Filhos da Tradição (2018), Portuguese Maria da Conceição (1953), Roberto Leal (2002), Dulce Pontes (1996), Mariza (2006) and Luso-African group Muxima (2006). Based on the analysis of one of the most recent versions of the song, by Delinda Bernardo, we also propose a reflection on responsibility in the use of oral traditional music in the context of world music. The discussion of this aspect is based on Steven Feld’s article “A sweet lullaby for world music”(2000). We also would like to acknowledge the theoretical contribution of Osmar Pereira Oliva’s article “Travessias do ‘Barco Negro’– o sequestro da mãe negra” (2016).

As informações apresentadas acima usam a grafia do original.