"Gente Humilde": um tema, duas canções – Amplificar

"Gente Humilde": um tema, duas canções

Resumo

Neste estudo, são analisadas duas versões de “Gente humilde” (Garoto), obra originalmente composta para violão que recebeu, entre 1950 e 1970, duas interpretações na forma de canção. A primeira, de autoria desconhecida, é uma narrativa em terceira pessoa que busca representar um espaço sócio-geográfico habitado pelos grupos menos favorecidos economicamente, traduzindo um imaginário para o qual esse espaço se constitui enquanto reserva de “pureza” e “felicidade”. Já na segunda versão, assinada por Vinicius de Moraes e Chico Buarque, ouve-se um momento de autorreflexão de um individuo sensibilizado com a precariedade das condições sociais de existência dos mais “humildes”, oscilando, contudo, entre uma postura mais consequente do ponto de vista político e outra marcada pela tentativa de retorno a um modo de vida comunitário. Tanto na primeira versão, narrada por uma espécie de “voz social”, quanto na segunda, que aponta para a crise de uma autoimagem orientada pelo ideal de “povo” e “nação” enquanto “totalidade”, constata-se que a condição de pobreza acaba por ser naturalizada. Neste artigo, procurar-se-á demonstrar como essa naturalização pode ser identificada a partir de uma análise formal das obras que enfatize as ambivalências e contradições inscritas em suas estruturas.

“Gente humilde”: a theme, two songs

In this paper, two versions of the lyrics written between 1950 and 1970 for “Gente Humilde”, originally composed by Garoto for guitar, are analyzed. The first one, written by an unknown songwriter, is a third-person narrative that seeks to represent a socio-geographical environment inhabited by economically disadvantaged groups, reflecting an imaginary for which this environment is constituted as reserve of “purity” and “happiness”. In the second version, than signed by Vinicius de Moraes and Chico Buarque, it is possible to hear a moment of self-reflection of a sensitized individual to the precarious social conditions of existence of the “humble”, oscillating, however, between a more consequent political point of view and by the attempt to return to a communal living. The condition of poverty turns out to be naturalized both in the first version, narrated by a kind of “social voice”, and the individuality expressed in the lyrics of Vinicius and Chico, which points to the crisis of self-image guided by the ideal of “people” and “nation” as “totality”. In this paper, we intend to demonstrate how this naturalization can be identified from a formal analysis of the works that emphasize the ambivalences and contradictions inscribed in their structures.

As informações apresentadas acima usam a grafia do original.